A cidade e o espaço urbano são coincidentes?
A cidade e o espaço urbano são coincidentes?
Segundo Henri Lefebvre, no seu «O direito à cidade», não.
Por cidade, entende o espaço físico e por urbano entende o intangível, a
potência. Podem convergir, criando o "espaço público", mas não são
coincidentes.
Bauman descrevia-os como o mundo sólido vs mundo líquido, coexistindo
no espaço público.
Sinceramente, cada vez mais me convenço que cidade e espaço
urbano não apenas não são coincidentes como estão, progressivamente a afastar-se.
Cada vez mais os cidadãos têm menos direito à cidade, menos capacidade de
intervenção sobre ela, havendo, de forma aparentemente paradoxal, naturais e
desejáveis movimentos de (re)apropriação do espaço urbano, por parte daqueles
que habitam a cidade. Explicito: hoje, o destino das cidades é mais decidido nos
centros nefrálgicos do poder económico, por parte de atores que não habitam a
cidade e menos por aqueles que as cruzam diariamente. Quando o CEO de uma grande
empresa toma, a partir de, por exemplo, Nova Iorque, a decisão de investir numa
cidade de província portuguesa, está a transformar esse espaço de forma mais
determinante do que qualquer habitante desse território. Entretanto, os
habitantes dessas cidades mobilizam-se, de forma cada vez mais crescente e
organizada, para dinamizar o espaço urbano, como um espaço de partilha, diálogo
e convivência. O crescimento dos mecanismos de participação são disso exemplo.
Vem tudo isto a propósito de uma reflexão que tenho vindo a realizar
sobre a real importância das nossas decisões individuais para o espaço público,
bem como a capacidade real de intervenção do poder político no planeamento das
cidades. Sim, é verdade que as ferramentas, aparentemente, estão nas mãos dos
decisores políticos. Contudo, também sabemos que o seu ordenamento legal, os
próprios instrumentos, são definidos por estruturas não apenas supraurbanas mas
até subranacionais. E assim sendo, quem habita a cidade tem cada vez menos
influência sobre o seu futuro. Resta-nos zelar pelo espaço urbano e garantir a
urbanização (no sentido que lhe deu Lefebvre) da cidade.
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