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A mostrar mensagens de setembro, 2012

Efeitos de uma crise

Não sei se é efeito da crise, se é porque estou mais atento, mas a verdade é que vejo cada vez mais indigentes na rua. Ou de mão estendida, sentados nos passeios, ou perseguindo-nos às portas e nos estacionamentos dos supermercados. Por norma, carregam ao colo crianças, algumas com apenas alguns meses de vida. Sempre que passo por elas, não lhes consigo enfrentar o olhar. Das crianças. Nos seus olhos vejo refletida, disforme, a minha alma. E é a alma de um pequeno burguês, efetivamente. A imagem de quem ainda consegue manter alguma qualidade de vida perante a miséria que grassa país fora. A pobreza já não está apenas no terceiro mundo. É nossa vizinha, mora já na porta ao lado. E de repente sinto o martelar das palavras na minha cabeça: - à noite os cadáveres ainda são mais pestilentos. O calor da lua fá-los libertar o cheiro nauseabundo da vida perdida. Porque um cadáver é um corpo exaurido de ar. Exaurido de mar. E é no silêncio que a morte grita mais alto. Filha, tremo só

Da política e de mim. Reflexão sobre as minhas opções

E aos 37 anos, aconteceu. Perco o encantamento pela política, porque reconheço que toda a minha vida tenho estado iludido com o sistema político português e com os partidos que dele se apropriaram. Olho para os benefícios que advieram para a maioria dos ex-titulares de cargos políticos nos últimos 30 anos e sou obrigado a reconhecer que muito poucos foram aqueles que estiveram na política para servir o país e o povo português. A política apenas serviu, efetivamente, para seu proveito próprio. E isto é transversal a PSD e PS. Faria de Oliveira, Dias Loureiro, Pina Moura, Jorge Coelho, Armando Mira Amaral, Ferreira do Amaral, António Vitorino, José Penedos são apenas alguns exemplos. E estou certo de que muitos ex-governantes de Sócrates aparecerão (já vai acontecendo, não é, Luis Amado?), tal como muito dos atuais governantes serão putativos gestores milionários de amanhã. Para além de que os negócios da coisa pública têm servido a todos, menos à causa pública. Apenas interesses privado

Espantado ante o absurdo

Camus desvendou o homem absurdo. O homem que já se olhou ao espelho milhares de vezes ao longo da sua vida e que num determinado dia, olha-se e espanta-se. É esbofeteado pelo absurdo, não reconhecendo o outro que está do outro lado. Um outro homem dentro do espelho e que certamente não é o mesmo. Este é o mistério da existência. É o mistério e é a sua verdade mais cruel. O homem está lançado no mundo e perante essa sua própria condição de condenado (a existir), espanta-se e só a partir desse momento começa a ter consciência de si. E é avassalador esse reconhecimento. É a capitulação ante a nossa sombra. A subjugação pela inevitabilidade. A consciência viva de que não somos um sonho sonhada por outrem. Que nem somos sonhados por nós próprios. Mas que a existência é totalidade de ser. Sei, querida, que ainda és demasiado pequena para este esmagamento existencial. Queira eu próprio ter força e sabedoria para te proteger dele. Mas, pelo sim, pelo não, registo a reflexão, não vá dar-se o ca

Désespoir: desesperança ou desespero?

Falava-te de desilusões. Sabes, vivo um período da minha vida em que o desapontamento é predominante. Melhor, reflito agora, não será desapontamento a palavra correta: desesperança! Cada vez mais, espero menos: menos do sistema político que me rege; menos dos meus líderes; menos dos que me cercam. Espero menos das promessas que me fazem; menos dos compromissos que comigo assumem; menos das juras eternas. Espero bem menos dos meus pares, menos dos meus chefes, menos dos meus subalternos. Menos dos meus amigos, menos do presente e, certamente, muito menos do futuro! Talvez porque a desaprendi (os portugueses já não sabem pronunciar esperança), o sentimento parece ter-se, também, desvanecido na planície do tempo. Não sei pronunciar e já não a sinto. Desesperança ou desespero? A língua francesa faz dos dois conceitos, uma só palavra. Contudo, tenho desesperança mas não estou desesperado. Apenas um pouco mais velho, quando gostaria era de ser mais antigo. Mas a vida não tem de ser de