Da política e de mim. Reflexão sobre as minhas opções

E aos 37 anos, aconteceu. Perco o encantamento pela política, porque reconheço que toda a minha vida tenho estado iludido com o sistema político português e com os partidos que dele se apropriaram.
Olho para os benefícios que advieram para a maioria dos ex-titulares de cargos políticos nos últimos 30 anos e sou obrigado a reconhecer que muito poucos foram aqueles que estiveram na política para servir o país e o povo português. A política apenas serviu, efetivamente, para seu proveito próprio. E isto é transversal a PSD e PS. Faria de Oliveira, Dias Loureiro, Pina Moura, Jorge Coelho, Armando Mira Amaral, Ferreira do Amaral, António Vitorino, José Penedos são apenas alguns exemplos.

E estou certo de que muitos ex-governantes de Sócrates aparecerão (já vai acontecendo, não é, Luis Amado?), tal como muito dos atuais governantes serão putativos gestores milionários de amanhã.

Para além de que os negócios da coisa pública têm servido a todos, menos à causa pública. Apenas interesses privados têm sido beneficiados com estes negócios. E sejamos francos – eu, pelo menos, estou a tentar sê-lo – o tráfico de influências em Portugal é abissal. Passa-se em todo o lado, todos os dias. E a guarda avançada desta corrupção são efetivamente os partidos do centro. Todos sabemos disso!

Por isso que afirmo, com bastante certeza e não menos mágoa, que o meu voto e a minha confiança foram desbaratados pelos partidos que constituem o arco de governação.

Como se não já não fosse grave, este não é apenas um momento passageiro. É o destino, é o ponto de chegada, desde percurso que os dois partidos iniciaram desde o 25 de Abril. Daqui, não há qualquer regeneração possível. Não para estes dois partidos. A lógica clientelar com que são liderados não o permite.

Estou certo de só se alterará alguma coisa com o fim do regime. Porque estas estruturas partidárias não se regem por doutrinas, ideologias ou princípios. As lideranças são casuísticas, ao sabor dos interesses individuais de quem puxa os cordelinhos.

Mas se me sinto desiludido com os partidos que afirmavam defender conceitos que eu próprio perfilho, tal não implica que entenda ter estado errado ao não apoiar outros partidos. Porque se me deixei levar pelo encantamento de ouvir na boca de outros aquilo que eu próprio diria, não deixa de ser verdade que não me convenceriam defendendo modelos de sociedade como a norte-coreana ou a cubana. E jamais poderia votar ao lado de quem defende o aborto como uma questão de livre-arbítrio feminino. Ou que sustenta uma contenda com as religiões e muito concretamente com aquela que professo.
E, assim, estou em crer que se votei enganado – e hoje não o voltaria a fazer! – também estou certo que em nenhum momento passado votaria noutro partido (e, nomeadamente nos da esquerda portuguesa). Porque, então, também não defendiam valores, princípios, doutrinas ou sequer posições próximas daquelas que eu defendia (e mantenho).
Reconheço-lhes coerência e até mesmo mais honestidade. Não lhes reconheço razão. Não razão fora do tempo.

Porque me interesso pelo que acontecerá no meu país, esta crise que atravesso não é irrelevante. Acredito – como sempre acreditei – que a política deve ser a mais nobre arte humana. E acredito – como sempre acreditei – que a nossa participação individual, revista-se ela de que forma for, é fundamental. Não é apenas uma exigência democrática. É uma exigência da consciência, à qual não podemos fugir.
Quero um mundo melhor para mim, para a minha ti, para a nossa família, para os meus amigos, para a nossa comunidade, para o nosso povo, mas também para o José, o João ou o Manel que vivem do outro lado do mundo. E isso não se muda pela inércia ou letargia, pelo mutismo ou inação. Altera-se pela dinâmica da atitude!
É, por isso, fundamental a política. Apesar da minha desilusão, que por vezes tende a arrastar-me para a alienação, para o desinteresse, não deixo de me envolver politicamente, ainda que apenas tentando alertar consciências que me estão próximas ou gritar presente nos atos constitucionais de participação. Porque creio ser fundamental à mudança.

E à questão, tão óbvia, de como ultrapassar a desilusão (por aqueles partidos que reclamam para si a doutrina que perfilho), afigura-se-me evidente: confiar politicamente em quem confio pessoalmente.
É certo de que nem todos os desiludidos se podem a dar a esse luxo. Nem todos conhecemos as pessoas que podem encabeçar alternativas políticas. Eu, também não, naturalmente. Não a um nível mais global. Contudo, nunca a premissa “think global, act local” fez tanto sentido para mim. E se hoje estou certo de que não posso mudar o mundo pela ideologia – porque alguns partidos se apropriaram ilegitimamente delas -, posso e devo tentar alterar a realidade que me está mais próxima, contribuindo, assim, para o todo. Com a morte anunciada dos estados-nação, com centros de decisão que são transnacionais, a participação apenas se pode instituir ao nível local. Porque é a este nível que conhecemos efetivamente quem nos pretende representar e porque é a este nível que podemos opormo-nos, de forma realista aos efeitos perversos desta globalização do capital, em detrimento de uma globalização para as pessoas.
Nada disto é novidade. Não descubro aqui nenhuma originalidade, nem tenho pretensão a isso. Por todo o lado vejo fazê-lo. Até sendo alvo da minha incompreensão. Tantas vezes fui injusto porque não lhes percebi essa verdade profunda que os levou a agir, de forma mais lesta, porquanto mais inteligentes e até mais intuitivos do que eu! Não obstante, este é o meu tempo. É o tempo do meu reconhecimento. Não é tarde, nem cedo: é o tempo que deve ser.

É preciso estabelecer compromissos, ordenar as prioridades – as minhas! –, estar preparado para cedências, calar as pequenas revoltas em favor de um bem que se me afigura maior.
Sei que tenho de esquecer pequenas diferenças, para reforçar primados.

Mutatis, mutandi e sinto-me, hoje, mais próximo das posições daqueles que outrora foram os meus maiores adversários. A vida é assim, o mundo é assim. Daí, se vem algum mal, foi o de eu o ter descoberto apenas agora. Lembro-me das palavras sábias de um amigo que há dois ou três anos me dizia ser tempo de fazer o que tinha de ser feito. E para ser feito o que tem de ser, é obrigatório saber em quem confiar. Que melhor sabedoria é aquela que se partilha à mesa? Não a partilhamos com maiorias, nem com grupos incógnitos, cujas motivações desconhecemos, não. Partilhamo-la com quem temos relações de afeto. Porque à minha mesa recebo quem eu o permito, vou descobrindo que quem é digno do meu afeto é capaz de ser digno da minha confiança política. É certo que desconheço as motivações dos outros – aqueles que não conheço – que também os apoiam. Mas, que raio!, tenho de ter um critério para depositar a minha confiança. E este, agora é o meu. Confiar politicamente em quem já deposito outro tipo de confiança!
A filosofia aconselha outra prudência: mas a foi racionalidade radical da filosofia – levar o conceito às últimas consequências - que me trouxe a esta crise interior.
Por isso, hoje, não acredito em projetos globais, doutrinários e/ou politico-filosóficos, porquanto não reconheço quem os possa liderar. Não acredito em ideologias complexas, programáticas e dogmáticas de sociedades perfeitas ou de criação de sociedades ou homens novos. Mas também não acredito que em Portugal existam partidos com outras alternativas, com aquelas com quem me tenho identificado a vida toda. Mantenho a minha crença no personalismo, acho que a social-democracia é um instrumento, mas não creio haver quem as personifique. Para isso, tenho a fé inabalável em Jesus Cristo e na Sua Igreja.
Nem, tampouco, reconheço lideranças nacionais que me arrebatem.
Assim sendo, a partir deste momento, voto e apoio em quem me parecer mais merecedor. E isso pode acontecer à esquerda ou à direita, mas não ao centro. PS e PSD têm sido as ferramentas utilizadas pelos “puppeteers” deste teatro de marionetas que se constituiu a política internacional e económica. Têm sido o motor da corrupção que grassa país fora. E algum dia é preciso gritar-lhes: chega!

Hoje, identifico-me muito mais com o discurso do PCP ou do BE, sendo que, ainda por cima, reconheço-lhes maior coerência e honestidade. Não concordo com tudo o que defendem, longe disso. Mas com esta derivação à direita, também eles aproximaram o seu discurso ao tradicional centro. Vieram ao encontro dos anseios da maioria. Por isso, é sem qualquer preconceito que olho-os como alternativas credíveis. Oiço o discurso de João Semedo e identifico-me com ele. Não me custa concordar com Miguel Tiago ou António Filipe. Aliás, concordo mais com eles, que estão comprometidos politicamente, do que com aqueles que têm o dever de isenção. Oiço José Gomes Ferreira e/ou o inenarrável Camilo Lourenço e estou certo de que as suas opiniões são mais marcadas ideologicamente do que as de alguns políticos, nomeadamente aqueles que citei.

Por isso, a partir de agora tanto posso votar CDS-PP como no BE. E o critério tanto poderá ser o conhecimento da pessoa, como o reconhecimento da sua honestidade. PS e ou PSD, porque são a face visível do tráfico de influências, é que não. Por enquanto, não!

Quanto a projetos globais, não me convencerão mais por alardearem teorias que defendo. Olha, se outro critério não houver, poderá passar por ser pela coerência que reconhecer aos líderes

Deixo, assim, claro que mantendo o meu horizonte ideológico onde sempre esteve, a minha intervenção política e/ou cidadã passará pela confiança nas pessoas. O que poderá acontecer à Direita ou à Esquerda, conforme me for parecendo adequado ao longo do caminho.

Partilho esta minha reflexão neste teu blog, minha filha, porque também quero que vás conhecendo as minhas opiniões sobre o mundo. Se fosse apenas para te mimar, melhor seria agarrar-te e beijar-te o dia todo!

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