Da injustiça
Nas sociedades social-democratas (que são aquelas que têm sistemas de segurança social mais ou menos eficazes, assentes no sistema previdencial de natureza contributiva), estabeleceu-se como regra para a tributação do IRS e para a concessão de apoios e direitos sociais (como a ação social) a regra da progressividade. Isto é: paga mais quem mais ganha e recebe mais quem tem menor rendimentos. Isto acontece por uma boa razão: esta solidariedade social permite a redistribuição de rendimentos dos que mais ganham em favor dos que ganham menos. Desta forma, promove-se a justiça social e corrige-se ou, pelo menos, esbatem-se, os desequilíbrios sociais que advêm do rendimento individual, concorrendo assim para a igualdade de oportunidades a todos os cidadãos.
É nesta lógica que assenta a ação social escolar: apoia-se financeiramente as famílias carenciadas para que as suas crianças possam ter acesso aos mesmos recursos escolares que aqueles que são provenientes de famílias mais abastadas.
Ora, há agora uma moda, a que a Câmara Municipal do Funchal aderiu, que inverte absolutamente este processo. No próximo ano letivo, a Câmara Municipal do Funchal anunciou que iria dar mais dinheiro a quem mais recebe. Prevê dar 60,00€, por aluno, às famílias com maiores rendimentos e 20,00€ às famílias com menores rendimentos, para fazerem face às despesas escolares. E mais, nesta lógica, nem as famílias que têm crianças em colégios privados ficam de fora. Também essas levam 60,00€.
Não percebo a razão que justifica esta medida absolutamente injusta de um ponto de vista social (Cafôfo assume-se como uma espécie de Robin Hood ao contrário: dá mais aos mais ricos e menos aos mais pobres). Não percebo nem a aceito. Se é em nome da gratuitidade do ensino, então teria de estender a medida a toda a escolaridade obrigatória. Se não tem recursos para isso, então também não deveria desbaratar recursos desta forma absolutamente populista e despesista. Com os recursos que assim desbarata poderia continuar a apoiar os alunos carenciados nos outros níveis de ensino. Com os recursos que desbarata, poderia apoiar ainda mais os alunos carenciados do 1º ciclo, que, por exemplo, fazem educação física com sapatilhas quase rotas porque os pais não podem comprar novas. Com os recursos desbaratados desta forma, poderia oferecer livros aos alunos cujas famílias não têm dinheiro para os comprar. Com os recursos que desbarata poderia equipar mais as escolas públicas com recursos pedagógicos, didácticos e tecnológicos.
Sinceramente, esta é daquelas medidas que me revoltam e me dão náuseas: porque desbarata-se recursos financeiros que poderiam favorecer a justiça social e o sucesso educativo. Em nome de quê? Em nome de uma campanha eleitoral!
PS – Também acho piada que nem PS nem BE tenham nada a dizer sobre isto. Que aceitem impavidamente este tipo de discriminação dos mais desfavorecidos. Tal como acho piada que aqueles que estão sempre a vociferar contra a desertificação dos concelhos rurais não vejam, em medidas como esta, algumas das razões para essa desertificação: uma concorrência desleal na captação de alunos por parte de autarquias com mais recursos.
PS – Também acho piada que nem PS nem BE tenham nada a dizer sobre isto. Que aceitem impavidamente este tipo de discriminação dos mais desfavorecidos. Tal como acho piada que aqueles que estão sempre a vociferar contra a desertificação dos concelhos rurais não vejam, em medidas como esta, algumas das razões para essa desertificação: uma concorrência desleal na captação de alunos por parte de autarquias com mais recursos.
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