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ALMA DE ESCRAVO | 17/05/2018 08:30



Na política madeirense, há quem, de facto, revele alma de escravo e esteja disposto a aceitar tudo o que lhe é imposto a partir do centralismo de Lisboa.
As razões para que isso suceda são várias: alguns porque essa é mesmo a sua condição; outros porque lhes impuseram essa conceção e essa imagem de si próprios; outros, ainda, porque lhes parece ser esse o caminho para atingir o seu projeto de poder; e por fim, uns quantos que assim conseguem disfarçar a extraordinária flexibilidade da sua coluna vertebral.
Recuemos à Grécia Antiga.
Como filósofo sistémico (e com pensamento sistemático, mesmo que anacrónico), Aristóteles refletiu sobre quase toda a realidade do seu tempo. Para a posteridade deixou inúmeros argumentos que, ao longo dos anos, foram sendo interpretados e reinterpretados à luz dos contextos filosóficos, políticos, geográficos, históricos, culturais, ideológicos e até éticos.
Como realidade premente da sua época, e porque também há 2400 anos na Grécia havia controvérsia sobre a legitimidade da escravatura e as relações de poder, o filósofo deixou-nos algumas reflexões, dispersas, especialmente pela sua “Política” e “Ética a Nicómaco”.
Nestas reflexões, Aristóteles é forçado a reconhecer que a escravatura não é um estado natural da alma humana e que é mesmo contrária à natureza, uma vez que todos os homens são naturalmente livres.
Mas esta é só parte da história. Porque pretendia justificar a escravatura, o filósofo tenta encontrar uma explicação racional e apresenta-nos dois tipos de escravatura: o escravo por convenção (lei) e o escravo por natureza. No primeiro caso, a escravatura é imposta pela força e está reservada apenas aos inimigos em consequência da sua captura em cenários de guerra.
Já a escravatura por natureza parece mais difícil de explicar e ainda mais de justificar, atendendo à tal liberdade intrínseca à natureza humana. Tenta resolver o paradoxo com algumas explicações mais ou menos tautológicas: “Um ser que, por natureza, não pertence a si mesmo, mas a um outro, mesmo sendo homem é, por natureza, um escravo”. E porque “alguns homens nascem para comandar e outros para serem comandados”, Aristóteles “prova”, desta forma que, não nascendo escravos, há homens que têm “alma de escravos”.
Voltemos à realidade nacional e façamos a cronologia dos factos: o Primeiro-Ministro vem à Região Autónoma da Madeira e ao invés de informar o Presidente do Governo Regional, manda o recado por interpostas pessoas; depois da primeira falta de cortesia protocolar, pretende apresentar cumprimentos ao Presidente do Governo Regional no Palácio de São Lourenço, não se dignando a dirigir-se à Residência Oficial do Presidente do Governo, nem equacionando esse encontro na Assembleia Legislativa da Madeira. Ou seja, quer que o Presidente do Governo Regional lhe vá prestar vassalagem à sede do colonialismo.
O Primeiro-Ministro, desta forma, não só revela um profundo desrespeito pelas instituições autonómicas como assume uma atitude hostil para como os órgãos próprios da Região. Pretende humilhar o Presidente do Governo Regional e, desta forma, humilhar todo o povo madeirense, que conquistou, estoicamente, a sua própria autonomia. E revela que não está interessado em contribuir para a resolução dos problemas que afligem os madeirenses como, aliás, é sua obrigação constitucional. Tenta humilhar e ofender e todos vemos isso. Todos, excepto aqueles que revelam a tal alma de escravo. Que se submetem de vontade própria a estas imposições imperialistas.
Não, caro senhor Primeiro-Ministro, fique ciente de que por cá resiste um povo orgulhoso da sua história e da sua cultura e que não prescinde da sua liberdade. Pode por cá ter lacaios com alma de escravo, mas os demais resistirão e não aceitarão resignados serem tratados com desrespeito. Podem querer impor-nos a “escravatura” mas jamais a aceitaremos: porque da nossa liberdade e da nossa dignidade, de Região Autónoma, não prescindimos! Venha cá, se vier por bem. Mas venha respeitando a terra e o povo que o acolhe. Porque esse é não apenas o seu dever mas a sua obrigação moral. E se o esquecer, creia que estaremos cá para o recordar. Sem qualquer vestígio de escravidão na alma!

https://www.jm-madeira.pt/opinioes/ver/1297/Alma_de_escravo


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