A IMIGRAÇÃO É ASSUNTO POLICIAL? Opinião | 18/12/2020 08:20


Na sua coluna de opinião no Público, do passado dia 14, Rui Pena Pires afirmou: "A imigração não é um assunto de polícia e o SEF deve ser extinto (...). Sem dramas e sem uma culpabilização coletiva que a maioria dos seus agentes não merece." Não poderia estar mais de acordo. O controlo fronteiriço, a imigração ilegal, a investigação criminal e o combate ao tráfico de seres humanos é matéria de forças policiais e de segurança. A imigração não! Os imigrantes não podem nem devem ser tratados como suspeitos. Porque a imigração, ou melhor dito, as migrações, não se constituem, per se, um ilícito. E é essa a ideia que passa quando obrigamos as pessoas imigrantes a tratar da sua documentação num balcão de polícia. O que, naturalmente, potencia comportamentos xenófobos, uma vez que institucionalmente é o próprio Estado a transmitir a ideia de que os migrantes devem ser “processados” por forças de segurança. Repare-se que até os estrangeiros que vêm a Portugal para investir ou aqueles com altas qualificações, que nos vêm ajudar a desenvolver o nosso país, são obrigados a sentarem-se ao balcão de uma força policial, em frente a um agente, para solicitar ou renovar a sua autorização de residência. Faz sentido? Esta dimensão administrativa, que é uma questão de integração, não deveria ser tratada por serviços civis? Fará, igualmente, sentido, que matérias como cedência de asilo ou proteção internacional a refugiados sejam processados por uma força policial?

As pessoas emigram por diversos motivos. Estes passam pelas questões económicas e de qualidade de vida, pela fuga a guerras e conflitos, pela procura de segurança e estabilidade, devido a fenómenos naturais (nomeadamente climáticos), entre outros. Por outro lado, as migrações são um importante factor de reprodução da população. Num momento em que assistimos a uma abrupta quebra demográfica na Europa (e muito acentuada em Portugal), não parece ser avisado continuar a tratar os imigrantes como potenciais criminosos. Aliás, creio mesmo que teremos de inverter este paradigma e passar a olhar para os imigrantes como potenciais cidadãos de plenos direitos. E já que estamos a discutir institucionalmente e politicamente o SEF, enquanto serviço que processa a imigração, não nos deveremos ficar pela questão da sua eventual extinção e consequente distribuição das suas competências. É hora de ser mais ousado e pensar as políticas de acolhimento, as políticas de antidiscriminação e de promoção de igualdade, bem como as políticas de inclusão identitária. Porque vamos continuar a assistir a um aumento da imigração, mas essencialmente porque necessitamos desses imigrantes, se quisermos continuar a ser viáveis como país e como nação.

Obviamente que de tudo o que escrevi não decorre qualquer culpabilização dos funcionários do SEF. Não devemos nem temos o direito de demonizar o serviço. Se existia foi porque o poder político e nós como sociedade entendemos haver razões para tal. E os seus funcionários cumpriram e cumprem de forma séria, profissional e rigorosa as funções que lhes estão atribuídas. Numa eventual reestruturação dos serviços de imigração, deverão ser transferidos para onde se sintam mais vocacionados. Sem dramas e sem qualquer tipo de animosidade. Aliás, como acontece quase mensalmente, quando na máquina administrativa do Estado são extintos, criados, fundidos, serviços que, por um motivo ou por outro, deixaram de responder às necessidades dessa máquina e dos próprios cidadãos.

Por último, uma palavra de apreço e agradecimento aos serviços do SEF aqui na Região: ao longo dos anos, habituou-nos à prestação de um serviço de qualidade, mesmo quando os meios lhe foram negados pelo Ministério da Administração Interna. Nesta Região, o SEF tem se assumido como um parceiro efetivo das autoridades regionais na integração dos imigrantes, assumindo, não raras vezes, uma postura de simplificação administrativa, inovando e instituindo procedimentos com vista à plena integração. Esta tem sido a prática do SEF, mesmo com todas as dificuldades ao nível de instalações, de recursos humanos, de meios logísticos e de algumas alterações ao seu funcionamento instituídas a partir de Lisboa e que contribuíram para alguma quebra na qualidade do serviço prestado. Apesar da tutela nunca lhes ter facilitado a vida, dirigentes e funcionários do SEF têm, de facto, procurado garantir o funcionamento do serviço com elevados parâmetros de qualidade e humanismo, tendo em vista a integração dos imigrantes, sendo um decisivo factor da estabilidade e da ausência de tensões ou conflitos que se vive na Região. Por isso, a todos, o nosso muito obrigado!

 

PS - Para aqueles que têm feito o favor de me ler nas páginas deste nosso JM, os meus sinceros votos de um Santo e Feliz Natal e um próspero Ano Novo.


https://www.jm-madeira.pt/opinioes/ver/4506/A_imigracao_e_assunto_policialf

 

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