Dos olhos iníquos ou quando as sensações e sentimentos provam ou desmentem a epistemologia moderna.
Fala o homem
lento.
Não sei como
poderia achar-me apaixonado por
uma alma tão pueril, tão imprudente? És demasiado nova para o amor calmo e
terno da velhice. Para o amor sublime. Como poderás ser amante, se não sabes
ser amiga? Como poderias ser curandeira, se nem serves para acalmar o estado
febril? E a solidariedade é uma flor que se cultiva. Não é a parasita do
jardim. És selvagem, mas não és orquídea. E não, não é o olhar feminino que determina
a evolução, porque a origem da beleza reside na opção pela bondade… E essa não encontra
a resposta no darwinismo.
O sabor a morango que se desprende dos teus lábios apenas
comprova a iniquidade do que vive agarrado aos teus olhos. Porque hoje sei que não
tens olhar. O olhar exige a compreensão da distância e não apenas o que vive na
iris. E os fantasmas estão sempre tão próximos, porque são sombras no glóbulo
ocular. São a miséria que tens para oferecer. Por isso, recuso a inundação da
saliva que me prometes, a humidade tépida com que garantes me irás cobrir.
Esqueces (já soubeste?) que a reciprocidade é a marca das
relações. E as tuas ações despertam em mim uma ação de igual proporcionalidade,
mas de direção contrária*. Não se ama alguém de quem não se gosta. E cada vez
mais me convenço não seres merecedora do meu gosto.
És a filha da madrugada que sempre temi. Pensas que não
tens amigos por escolha, quando na verdade é apenas porque te consideras a
deusa-sol. Consegues olhar para trás? Atreves-te a revolver as pedras que
pisas, para olhar bem debaixo delas? Vês os cadáveres que lá estão, abandonados por ti? Saberás que nesse teu caminho não ficou nada para além da solidão?
Lembras-te que poderia ser o teu salvador?
Agora vou. Sei que não lamentarás porque não és capaz de
entender o que digo, bem menos o que havia para te dar.
E a mão grande que tinha para te agarrar, é a outra que
ofereço. Porque eu sei ser a quem é por mim.
* Isaac Newton
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