Raríssimas vezes assistimos a tanta indecência

Opinião | 15/12/2017 08:03
Dezembro é o mês da Festa, da celebração do amor, da alegria, da família. Mas este dezembro de 2017 foi também o mês em que fomos confrontados com algumas das piores indecências que proliferam na sociedade portuguesa.
Descobrimos uma igreja - que se diz universal – que a partir de um lar que alojou várias crianças roubadas às mães, dinamizou uma rede internacional de adoções ilegais para os seus membros.
Foi o mês em que assistimos ao vivo um jovem atirar um sem-abrigo para dentro de um caixote do lixo, na Amadora. Em que tomámos conhecimento da triste notícia de três jovens que agrediram, gratuitamente, um sem-abrigo, no Funchal.
Foi o mês em que descobrimos a história macabra de uma dirigente que roubava a crianças doentes para financiar os seus luxos pessoais.
De facto, a história da Raríssimas é, tragicamente, uma história demasiado comum em Portugal. Talvez sintomática do que se passa no país, do nosso miserável fado: a história de compadrios, de promiscuidade entre política e associativismo; entre instituições de solidariedade e beneficência e poder económico. Uma história de vigaristas em lugares de poder; de trafulhas travestidos de benfeitores. É uma história de trapaças e trapaceiros que abusam da fragilidade de crianças, de doentes, de crianças doentes, para trepar na hierarquia social. Uma história de ambição, ganância e conluio. De ligações perigosas e nepotismo. De conivência e abuso de poder. De como há quem atire qualquer réstia de dignidade para a lama desde que possa chafurdar no gamelão. Uma história de crime e violência sobre os mais frágeis.
Uma história de nojo, de ignomínia, de canalhice.
É a história de uma dirigente que utiliza os recursos de uma instituição de solidariedade social para luxos pessoais. Que promove a promiscuidade entre a dimensão pessoal e a dimensão profissional. De uma dirigente prepotente, autoritária, defensora da iniquidade. Que faz do nepotismo uma forma de vida e uma arte.
É também a história de políticos que são coniventes com esta gestão danosa e desonesta. Que beneficiam dela.
É a história de falta de atenção, de vigilância, de regulação. Da ineficácia dos meios de fiscalização do Estado, que não garante o cumprimento dos princípios da defesa do interesse público e da transparência. Que falhou na defesa dos mais fracos. A história da falência do Estado em garantir o princípio da legalidade.
Sinceramente, na imundice que é esta história, apenas nos apetece adjetivar, injuriar, descompor. Porque tudo isto é demasiado indigno e vil.
E no fim, quem perde, uma vez mais, são os desprotegidos. As vítimas de doenças raras que assim vão deixar de obter a imprescindível ajuda da sociedade. Porque ninguém quer financiar instituições geridas de forma criminosa. E tudo porque uma pessoa, algumas pessoas, apropriaram-se de forma desprezível e obscena de recursos e património que deveriam ser para solidariedade.
É triste, mas este não parece estar a ser o mês da paz e do amor.
Resta-nos esperar por 2018. A continuar assim, que 2017 se vá depressa porque precisamos, urgentemente, de boas notícias, bons exemplos e boas ações.
Feliz Ano Novo! 

https://www.jm-madeira.pt/opinioes/ver/811/Rarissimas_vezes_assistimos_a_tanta_indecencia


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