“ENTRE FALAR E FAZER HÁ MUITO QUE DIZER” Opinião | 12/03/2021 08:01

 


Recentemente, um amigo foi alvo da maledicência de um perfil falso, numa rede social. Há já algum tempo, o JM publicou um artigo sobre a existência de uma multiplicidade de perfis falsos que povoam as redes sociais, a blogosfera e as caixas de comentários dos órgãos de comunicação social.

O caso do meu amigo (e de tantas outras vítimas) e a reportagem do JM revelam a realidade incontornável que foi a transposição para o meio virtual daquilo que é uma prática comum e secularmente enraizada na nossa sociedade: a maledicência.  As TIC apenas vieram amplificar esta prática, porquanto permitem a intriga, a ofensa, a agressão, a calúnia e a difamação no absoluto e cobarde anonimato.

Há quem atribua esta nova prática (maledicência anónima digital) a um certo condicionalismo a que a sociedade madeirense estará sujeita devido a séculos de canga (conforme imortalizada por Horário Bento de Gouveia) e à repressão de que foi alvo e que oprimiu o povo madeirense. Reconhecendo essa opressão, não vou por aí. Não sou estruturalista e não acredito que as ações humanas sejam apenas consequências inevitáveis dos condicionamentos existentes. Há mecanismos indutores de comportamentos, intrínsecos e extrínsecos, reais e imaginários, mas a nossa ação não é apenas reação, porquanto somos munidos de razão e vontade próprias e livre-arbítrio. As dependências e relações (profissionais, políticas e/ou familiares), o medo, a ameaça, a chantagem não servem – não podem servir! – de justificação para esta prática torpe e cobarde.

A verdade é que está aí. E já não é apenas a manifestação espontânea dos trolls virtuais ou daqueles “imbecis” de que nos fala Umberto Eco, quando afirmou que esta legião deixou de ser silenciada e passou a ter o mesmo direito à palavra que um Prémio Nobel. Fez-se profissional e todos os partidos e movimentos políticos contam com esta prática para o combate nas redes sociais. Não que a intriga ou a calúnia sejam novidades neste mundo. O que acontece agora é que muitos agentes políticos consideram que recorrer a estes expedientes é eficaz e legítimo! Aliás, em muitos espaços virtuais assistimos a espetáculos ridículos e degradantes de perfis falsos acusarem outros de o serem. Digladiam-se como heróis corajosos quando não passam de cobardes sórdidos e desprezíveis. Também assistimos a outro tipo de fenómeno que é o de ver pessoas que sabemos serem possuidores de perfis falsos manifestarem-se contra essa prática. Foi a este espetáculo que assisti quando esse meu amigo denunciou o seu caso.

Mas se alguns agentes políticos não só aceitam como promovem a prática, a comunicação social tradicional também não fica atrás, ao dar eco a fake news, ao não questionar as fontes, ao publicar, ipsis verbis, os textos que lhes são enviados pelas máquinas de propaganda – com o ridículo de depois serem assinados por jornalistas encartados! -, ao recorrer a algumas dessas latrinas virtuais para encontrar matéria noticiosa. Já chegámos ao ponto de ler uma peça jornalística a promover um desses sites como se de um órgão social legítimo se tratasse (isto aconteceu, é verdade!). Mais, os órgãos de comunicação social promovem mesmo este tipo de prática naquelas páginas semanais que intitulam de humorísticas, mas que são apenas espaços para destilar os ódios pessoais e frustrações de alguns jornalistas relativamente a agentes políticos (especial alvo desta horda), económicos, sociais e culturais.

A verdade é que os murmuradores estão generalizados e estão por toda a parte. E não há forma de os combater de forma honesta ou séria. Aplica-se aqui a máxima de Mark Twain: “nunca discutas com um idiota. Ele arrasta-te até ao nível dele e depois vence-te pela experiência”. Resta apenas ignorar a horda, não condescender com a prática e denunciar os praticantes. É isso que eu tento fazer: não vacilar ou transigir com a ignomínia, pelo bem da higiene pública!

https://www.jm-madeira.pt/opinioes/ver/4765/Entre_falar_e_fazer_ha_muito_que_dizer


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