Infiltrados?

Muito se tem falado sobre a possibilidade de virem infiltrados do Daesh nas hostes de refugiados sírios que chegam à Europa pela rota dos Balcãs. Uma vez mais, neste caso, o mito supera largamente a realidade. Não querendo afirmar que é impossível essa infiltração, do que tenho lido, o que me parece é que ela é muito pouco plausível ou provável.
Vamos a factos: o objetivo inicial deste grupo terrorista foi controlar o Norte e o Oeste do Iraque, maioritariamente sunita mas dominado pelos xiitas. Grande parte das elites dirigentes do Daesh são ex-comandantes sunitas de Saddam Hussein. A Síria, também ela maioritariamente sunita foi apenas uma oportunidade, fruto da desestabilização do regime de Bashar Al-Assad, resultado da primavera árabe.
Mas tendo em consideração que muitas populações sunitas sírias (do mesmo ramo do Islão, portanto, que os líderes do Daesh) foram alvo da repressão violenta de Assad (alauita), não seria de supor que estariam ao lado do Daesh? Não, a maioria sunita da Síria luta contra o Daesh porque esta é uma força de ocupação estrangeira, não tendo o Daesh qualquer base de apoio sociológico na Síria. Aliás, aterroriza as populações e a sua estrutura de comando é iraquiana e as populações não querem o desmembramento do seu país.
Ora, não me parece provável que estas populações que fogem simultaneamente da repressão violenta de Assad e dos ataques bárbaros do Daesh queiram acolher no seu seio jihadistas.
Também convém lembrar que a população síria é constituída por diversos grupos étnicos (árabes, gregos, arménios, assírios, curdos, mandeus e circassianos) e religiosos (sunitas, xiitas, cristãos, alauitas, yazidis, mandeus, drusos), sendo muito pouco plausível que toda esta diversidade, alvo da barbárie do Daesh, acolhesse militantes terroristas.
Por último, se nos lembrarmos, então, que a Síria tem uma história milenar de cultura e tolerância (lembremo-nos da cidade de Palmira, fundada pela rainha Zenóbia, que ali criou o maior e mais importante centro cultural do Médio Oriente, no século III, ou de Damasco, cidade desde sempre associada à cultura) percebemos que os refugiados sírios talvez não sejam o melhor esconderijo para jihadistas do Daesh.

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