Amontoado de desilusões

A desilusão é um sentimento poderoso. Por vezes, parece-me, não somos mais do que um acumular de desilusões. E, pela vida fora, as desilusões parecem ocupar cada vez mais espaço.


Será assim, como o tempo: um dia é demasiado longo quando apenas vivemos 8. Contudo, parece tão pequeno quando já vivemos 8000! Tem a ver com a dimensão. O caminho parece mais curto, quando percorremos já a segunda metade…

E de modo similar, creio eu, acontece com as desilusões. Não são importantes quando apenas conhecemos 10 – então, somos tão mais do que isso! Mas, à medida que as vamos colecionando e porque as acumulamos demais – a nossa maior riqueza, no sentido em que é aquilo que mais possuímos -, atinge-se um ponto em que parece nada mais existir para além dela. Talvez seja por isso que os velhos enlouquecem ou morrem. Porque aos velhos desiludidos, nada mais resta do que a demência ou a morte.

Ao longo da vida, é-se chegado a um ponto em que a nossa capacidade para colecionar desilusões esgota-se. Não conseguimos carregar mais cadáveres. E então, morre-se.

A desilusão corrói aquilo que achávamos ter de melhor. Aquilo que de melhor julgávamos ver nos outros e que nos completava ou, pelo menos, nos fazia felizes. É um incêndio incontrolável, que cresce na igual medida que consome.

Ainda se apenas transportássemos fantasmas. Mas a natureza – ou Deus! – é demasiado caprichosa e faz-nos carregar com os nossos fardos. Os cadáveres não são abandonados atrás de nós: ficam-nos acorrentados e deles não conseguimos fugir.

Tentarei, filha, que tenhas tão poucas desilusões quanto possível. Tentarei carregar com todas as que puder, para te evitar esse fardo. Mas perdoa-me por não te conseguir proteger de todas! Porque não serei capaz. Ainda que me doa tanto como a ti.

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